Aniceto Rijo, Clara, Eduarda e Alexandre
Num destes serões em que a chuva caía e tudo indicava gozar o
calor da lareira, escolhi a da casa do Aniceto Rijo e aproveitar para falarmos
sobre a sua vida – origens, passado, presente e ler neste oleirense o que pensa
de tudo o que é o seu meio espreitando também a vertente dos seus interesses e
preocupações no futuro.
Este homem carregou o peso de ser “retornado”, o saber
adquirido pela entrega contínua ao trabalho diversificado, à entrega aos outros
e defesa dos outros – pessoas e bens – nos Bombeiros de Oleiros, também
enquanto autarca na Câmara Municipal, na parte cultural por estar à frente do
Rancho Folclórico, Presidente da Associação de Encarregados de Educação no
Agrupamento de Escolas Padre António de Andrade e dedicado e esforçado
empresário em Oleiros. É então sobre todas estas questões que vamos deixar o
relato da nossa conversa, respeitando a sequência da mesma.
A sua origem
É filho de Silvino Rijo (já falecido) e de Noémia Caldeira. O
Silvino era polícia e, por opção, foi para Moçambique onde estiveram 11 anos. O
Aniceto tinha somente um ano (nasceu em Lisboa) quando partiu mas já fez os 12
quando regressou a Portugal. Viveu, com os seus pais e irmão Helder Rijo, toda
a confusão e incerteza do futuro nas dificuldades decorrentes de serem
“retornados”, com tudo o que isso acarretava. Os traumas dos últimos tempos em
Moçambique marcaram muito este jovem. Estávamos em 1975 e era confusão a mais
para adultos mas quase o fim do mundo para os jovens desta idade que viram
ficar, lá distante, uma infância para ter que descobrir novos amigos,
frequentar novas escolas, enfrentar problemas de verdadeira integração.
Quando regressou veio acompanhado pela mãe que teve de o cá
deixar, conjuntamente com o irmão e voltar a Moçambique. Ficaram a viver com a
avó Eulália que, nesta altura da vida, encontra-se no Lar em Orvalho.
Posteriormente os pais vieram definitivamente e foram viver
para o Ribeiro de Peso, onde os jovens já moravam. “ Primeiro, na casa da minha
avó e, depois, no curral de bois o que levou o meu pai a melhorar essas
instalações, mas sempre a pensar vir a construir uma casa nova”, afirmou o
Aniceto. E continuou, afirmando que, “o meu avô Abílio Martins Rijo” deu ao meu
pai um terreno no lugar da Senhora das Candeias onde ali construiu a casa que
se conhece e que foi aumentando de acordo com as possibilidades. É onde mora a
minha mãe”.
O
trabalho – o Empresário
Com 14 anos e no dia que terminaram as aulas “comecei logo a
trabalhar na firma “Família Electromóveis” aqui em Oleiros e depois fui para
uma serralharia de alumínios e ferro, Alumínios Ventura”. Seguiu-se o
cumprimento da vida militar e desempenhou as funções de desenhador de
construção civil pois, “já tinha conhecimentos nesta área e seguidamente fiz
projetos até aos meus 40 anos. Abri então, conjuntamente com o meu pai uma
marcenaria cujas instalações e máquinas ainda existem. Entretanto casei (30
julho de 1988) e restruturamos no cimo da Vila uma casa de pneus por sugestão
do meu sogro Alírio Rodrigues. Para isso reformulou-se a antiga e célebre
moagem de Manuel Rodrigues David o avô da Clara, minha esposa. Para responder
mais e melhor e utilização de novas técnicas (máquinas) precisávamos de um novo
espaço e foi quando instalámos uma oficina na zona industrial da Alverca, onde
nos mantemos designada por AUTO PENEUS DO PINHAL. Mas, entretanto, (1998) como
em Oleiros tinha encerrado a “padaria Ramos”, eu e o Fernando Alves achámos que
tinha de haver aqui, forçosamente, uma padaria e construímo-la, de raiz, também
na zona industrial. Atualmente já não somos os proprietários continuando a
funcionar com enorme êxito e qualidade, é a Padeirinha do Pinhal”
A vida como bombeiro
Tem 31 anos de serviço mas atualmente não desempenha. Todos
conhecem a sua dedicação e saber, a entrega e satisfação enquanto desempenhou
funções. Era uma casa de bombeiros, ele, o irmão Helder e o tio João Rijo. O
seu maior gozo dentro desta Instituição “foi a camaradagem, a ajuda ao próximo
e a salvaguarda do património. Este Corpo de Bombeiros é como que uma escola
para muitos outros e posso dizer mais, “antigos dirigentes nacionais chegaram a
afirmar que Oleiros era a universidade do combate aos fogos florestais”.
Tem muita honra em ter pertencido a esta Associação e, só
saiu porque a sua vida profissional já não lhe permitia ter a disponibilidade
que agora é exigida, disse.
“Estou certo de que a forma de trabalhar dos bombeiros da
zona do pinhal é ímpar na sua eficácia. Temos a sorte de ter um bom CODIS (Rui
Esteves) e ser um excelente Comandante, aprendeu muito connosco”. Em jeito de
apreciação afirmou com satisfação que foi o último Comandante a colocar-lhe os
galões de Chefe.
É medalhado com ouro, prata, bronze e diploma de serviços
distintos atribuídos pela Liga Nacional de Bombeiros. É agora Chefe do Quadro
de Honra desde outubro de 1998. Fez parte de duas direcções e teve como
Comandantes os senhores Álvaro Ferreira de Matos (falecido), José Coelho
Caldeira, Francisco Luís Domingues, Armindo Lopes e Francisco Fernandes.
“O que mais me marcou? Sem dúvida o fogo de 2003, Foi de
loucos. Todos sabem como foi a sua propagação incontrolável. Em 1999 vi quase a
morte no Alto da Corujeira: o lume cercou-me e tive de me meter na valeta e ele
passou por cima, estava sozinho e isso nunca se faz. Em 2002, depois de noites
sem dormir e a apagar fogo com o Comando Superior a insistir, quando conduzia o
carro do Comando na localidade do Pedintal, mais uma vez sozinho, adormeci e
fui para a valeta, do outro lado da estrada estava um precipício abismal”.
Desempenho
no Rancho Folclórico e Etnográfico de Oleiros
Pelos anos oitenta é que se verificou a sua aproximação ao
Rancho e foi através do seu padrinho, João Rijo, com o objectivo de aprender a
tocar acordeão, mas diz que nunca o conseguiu atingir. “Já na situação de
empresário e nesta última fase do Rancho (reinício), solicitaram-me que
oferecesse a importância em dinheiro que permitisse comprar o tecido “sorrobeco”
para os trajes. Fi-lo com todo o gosto e quatro anos depois já estava na
Direção através de convite”, afirmou Aniceto.
Agora continua como Presidente da Direção entusiasmado porque
considera que este é um excelente Rancho e que muito tem feito pela cultura de
Oleiros e levando o seu nome a vários pontos do país e até alguns pontos do
mundo, através da divulgação dos meios visuais e sonoros.
O Rancho tem sede própria no Carril (Vila) cujo edifício foi
construído para tal fim pelos executantes com apoios dos oleirenses, por
empresas e, na parte final, também pela Câmara Municipal e Junta de Freguesia.
O terreno foi oferecido (e é hoje propriedade do Rancho) pelo sr. João Rei
(falecido), grande oleirense e muito amigo de manter vivas realidades da nossa
terra como a Banda e o Rancho. Atualmente existe um projeto de alteração do
original.
O Rancho tem aproximadamente 50 elementos, atua muitas vezes
sem cobrar qualquer importância mas outras vezes cobra só o montante que dê
para pagar as despesas com os instrumentos e aos tocadores de instrumentos
musicais. “Estamos sempre à disposição da Câmara Municipal, das Juntas de Freguesia
e Santas Casas de Misericórdia. Muitas outras atuações fazemo-las pelo sistema
de permuta com outros Ranchos ou outras organizações do tipo”, afirmou Aniceto
Rijo.
O mesmo fez sentir que, quando chegou ao Rancho “não havia
nada que perpetuasse usos e costumes da nossa terra e, por isso, lançámos já
dois DVDs temáticos e feitos por profissionais e lançámos também 1 CD musical.
Estamos já próximo do relançamento da nossa página de Internet e já estamos no
Facebook. Tudo isto se consegue graças ao excelente grupo de trabalho que lá
tenho”.
Participação
na comunidade escolar
Os seus dois filhos, Eduarda e Alexandre, foram e são como
ele foi alunos na escola Padre António de Andrade que é hoje Agrupamento. Como
tal, Aniceto Rijo interessou-se sempre pela vida na e da escola e, há vários
anos, é o Presidente da Associação de Encarregados de Educação. Mostra-se
contrário à formação dos mega-agrupamentos porque, afirma, “esse processo pode
vir a prejudicar muito Oleiros”.
O
político, o Vereador da Câmara
É vereador na Câmara Municipal de Oleiros, eleito como
independente nas listas do PS. Os outros quatro vereadores são do PSD. Não
escondeu a sua desilusão “devido ao facto de não ter tido apoio por parte das
estruturas da força política e cuja lista encabecei em relação a alguns
projetos que geram e geraram alguma controvérsia” e continua a precisar melhor,
“algumas propostas apresentadas necessitavam mais discussão, por vezes surgem
já como que concretizadas. No entanto, desempenho as minhas funções de vereador por Oleiros.”
No meio da conversa sobressaíram expressões que não posso
deixar de apresentar. Uma delas foi “os tempos mudam e a nossa forma de estar
também, como Oleirense lutador e perspicaz que sou estarei sempre alerta para defender
este concelho”. Pela análise destas palavras e doutras ficámos praticamente com
a certeza de que, provavelmente, não o teremos como cabeça de lista pelo PS nas
próximas eleições autárquicas. A segunda expressão está ligada a projetos que
gostaria de ver realizados. Um tem a ver com a proteção da floresta “este é o
nosso pulmão e o nosso sustento, as autarquias têm que ter mais atenção com a
realidade que se verifica. Sem conhecermos o passado não podemos fazer o
futuro, temos um significativo património habitacional e etnográfico e, deste
ultimo, não temos um local específico para o mostrar”. Já quanto ao turismo local, Aniceto Rijo
defende que “tem que existir uma estrutura ao nível concelhio, que envolva
todos os operadores locais e os interessados de forma a proporcionar uma
amostragem da beleza do nosso concelho e da diversificação de propostas que
temos. Existe muito trabalho a fazer neste sector”.
Por fim, após alguma insistência, mostrou o esboço de projeto
que gostaria de ver implantado nas Devesas Altas, afirmando ”assim, as nossas
associações/coletividades teriam um espaço condigno para as suas apresentações,
as crianças um espaço aberto
para brincar e o Maranho simbolizado na zona do pinhal”.
Não acabámos a conversa aberta sem que o Aniceto salientasse
que, “apesar das diferenças ideológicas, sempre existiu um respeito mútuo
importante para o funcionamento democrático da autarquia”.
Entrevista conduzida por Luís Mateus
maio de 2013
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